CRUZEIRO HISTÓRICO
PELOS ESPAÇOS DE VIEIRA

1 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
12 58´29”S, 38 30' 93”W

Vamos deixar em breve o Centro Náutico para ancorarmos, nestes últimos dias da nossa presença por estas bandas, no fundo da Baía de Todos os Santos, num dos portos da última geração dos terminais de carga do Brasil – por razões de compromissos com os patrocinadores que sustentam a nossa viagem.

Esta baía recebeu o seu nome do navegador Américo Vespucci, que entrou por aqui adentro no dia 1 de Novembro, dia de Todos os Santos de 1501, ao serviço do rei de Portugal, na frota comandada por Gaspar de Lemos, o mesmo que Cabral enviara de regresso ao reino um ano antes, após o encontro da sua frota com os indígenas de Porto Seguro. Já por cá andavam e continuariam a frequentar estas águas os franceses que não lhe tinham dado nome que figure nos anais; espanhóis e holandeses também conheciam os portos e ancoradouros desta “baía de todos”. Os índios Tupinambás, os mais numerosos da região, chamavam-lhe Kirimurê. Uma lenda indígena conta que no princípio do mundo uma enorme pomba branca, voando do infinito do céu, caiu exausta neste pedaço de terra e estendeu as suas asas para proteger o seu corpo do calor do sol e dos predadores. No lugar em que o seu coração parou de bater abriu-se um grande fosso que foi invadido pelas águas do mar e onde as suas asas repousaram nasceram praias de areia fina. As últimas batidas do seu bico fizeram jorrar fontes de água e seu sangue fecundou as colinas, para sempre recheadas de florestas ricas em alimentos para os bichos e para os homens.

Quando chegaram os grandes bichos que passaram os rios a nado e os homens do interior das terras que desceram os rios em canoas, já só restavam as últimas penas que o vento dispersava e ninguém conseguia alcançar. Muito tempo depois chegaram mais homens em grandes navios, puxados pelo vento; traziam armas de fogo, doenças desconhecidas, ambições desmedidas e desejos desenfreados. Foram ficando e fizeram desta terra e destas águas o espaço de uma nova civilização, de um novo mundo que surpreendeu e encantou todos os forasteiros do tempo que por aqui foram passando. Ainda não largámos, mas já soa o refrão de uma velha canção mais que cinquentenária: “Ai que saudade eu tenho da Bahia!”, para esquecer aquela poesia cheia de amargura e rancor de um poeta maldito, contemporâneo de Vieira, que escrevia em 1694: “Adeus praia, adeus cidade (…) Adeus povo, adeus Bahia… Que os brasileiros são bestas / e estarão a trabalhar / toda a vida pra manter / maganos de Portugal”. Chamava-se Gregório de Mattos e chamavam-no o “Boca do Inferno”.

 

2 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
12 58´29”S, 38 30' 93”W

Hoje é feriado em todo o Estado da Bahia. Comemora-se a vitória dos brasileiros contra o último reduto de tropas fiéis à coroa de Portugal, em 2 de Julho de 1823. Foi o último episódio de uma série de escaramuças pela independência que começou na cidade de Cachoeira, na margem esquerda do rio Paraguaçu, cidade que tinha aclamado um ano antes, a 25 de Junho de 1822, o príncipe D. Pedro como regente da nação brasileira. Os desentendimentos entre brasileiros e tropas portuguesas tinham começado em Fevereiro de 1822, com a chegada a Salvador de um oficial superior que não aceitava as posições independentistas do príncipe. O acto final da ruptura política aconteceu a 7 de Setembro de 1822 nas margens de um riacho, o Ipiranga, quando D. Pedro regressava de São Paulo ao Rio de Janeiro.

Quase um ano depois aconteceram os episódios de Salvador, onde não faltaram heróis e heroínas, como a irmã Joana Angélica, que sucumbiu durante a invasão do seu convento pelas tropas fiéis a Portugal e Maria Quitéria, que lutou vestida de soldado ao lado das forças libertadoras; para os bahianos, a verdadeira data da independência do Brasil é este 2 de Julho de 1823. O dia está recheado de competições desportivas, desfiles, discursos políticos, paradas de grupos étnicos e culturais, é festa na capital do Estado e nas cidades do Recôncavo. Pelo meio, os partidos políticos mostram os seus candidatos às próximas eleições municipais e os professores em greve, das universidades ao ensino básico, protestam contra os baixos salários. O ex-ministro da Educação do primeiro governo do presidente Lula, Cristóvam Buarque, apoia os grevistas, defendendo que o salário dos professores deveria triplicar. Solidário e coerente, participa no desfile desta manhã em Salvador, com os figurantes, os índios, os cavaleiros e os caboclos que percorrem a cidade velha, de Santo António Além do Carmo até ao Palácio Rio Branco. É bom e saudável pretexto para festa, mais uma, em Salvador.

Os habitantes da cidade nunca perdoaram ao marquês de Pombal ter mudado a capital da colónia para o Rio de Janeiro em 1763; menos de 200 anos depois, em 1960, a capital do Brasil mudava-se para Brasília, cidade criada de raiz para ser a metrópole do futuro. Mas há bahianos que ainda acreditam que um dia a cidade voltará a ser a capital do Brasil, quando neste imenso país se realizar o Quinto Império profetizado. Do mesmo modo que o Salvador do sermão de Vieira, salvando a sua cidade do ataque dos hereges salvou-se a si mesmo, será daqui que virá a salvação do Brasil como grande potência mundial de um futuro ainda por vislumbrar. Quem sabe, serão apenas saudades do futuro!

Enquanto o futuro não chega, Maria João Pires, bahiana da última geração dos desiludidos do país dos fados, dá um concerto de piano no Teatro Castro Alves, para que a festa seja ainda mais gostosa e tudo acabe em harmonia.

 

5 de Julho de 2007, Salvador da Bahia..
12 58´29”S, 38 30' 93”W

Os últimos dias da nossa estadia nestas terras e nestas águas são exactamente como os de qualquer pessoa que parou por umas semanas em qualquer arraial: cheios de coisas por fazer, tendo que deixar as mantas urdidas no tear para outros acabarem de tecer. Ontem chegou o professor José Peralta da EUROPAN de São Paulo com os novos brinquedos de foto e de vídeo, uns degraus acima do nosso equipamento. À noite foi dia de festa em Itapuã, em casa da família Abreu Freire Valente, estação obrigatória da minha peregrinação familiar. Num jardim à beira da praia encontrei uma estátua em bronze de Vinícius de Moraes, sentado a uma mesa, como ele costumava fazer quando viveu nestas dunas, apaixonado por uma mulher bahiana, escrevendo letras e músicas e escutando o mar roncar nas pedras. Itapuã significa, em língua Tupi, “pedra que ronca”.

Eu te amo tanto, Maria, te amo tanto
Que o meu peito me dói como em doença
E quanto mais me seja a dor imensa
Mais cresce na minha alma teu encanto

Hoje, para nós, a rima vai ter almoço e jantar de trabalho, nas mesas vão estar vatapá de camarão, pato com tucupi à moda do norte e a métrica é a do nosso trabalho futuro. Quando não estamos a comer e a escrever cumprimos obrigações com a comunicação social e os visitantes de última hora! Vamos ter que tirar tempo para comprar alhos, cebolas, leite, manteiga, guaraná, ração do Cuécué para a viagem até Recife, enquanto vigiamos a chegada das frentes frias para não termos surpresas no mar, porque é Inverno por estas bandas. O nosso colega italiano de estibordo partiu esta madrugada sem pedir licença ao barómetro e regressou a meio da tarde ao mesmo sítio, com toda a tripulação enjoada e o convés num estado lamentável.

Amanhã pela manhã temos mais um programa de TV que se interessa por nós, ao meio dia somos convidados do Cônsul de Portugal, diplomata tão discreto quanto apreciado e respeitado por todos quantos com ele contactam; à tarde recebemos a tropa de choque da direcção da DURIT e à noite devemos companhia ao director do grupo de comunicação A TARDE. Talvez possamos partir no início da próxima semana, se estivermos ainda vivos. O CHIC já teve a devida limpeza do casco, desembaraçado agora das cracas e algas que invadiram a sua linha de flutuação, as entradas e saídas de águas, a hélice e o leme. Uma avaria intempestiva no sistema eléctrico foi reparada com novos cabos e fusíveis e o motor já se reabituou às rotações depois de dois meses de repouso. Parece que estamos mesmo de partida da Baía de Todos os Santos.

Não vai ser fácil recolocar tudo no seu lugar: a mesa das cartas tem que voltar a servir para navegação e não para suporte de computadores, os livros voltam para as caixas estanques, a alimentação ocupa o seu lugar e sobretudo não podemos deixar correr a água nas torneiras como nos habituámos neste tempo de paragem. Partir c’est mourrir un peu, ou talvez não; será apenas respirar o mesmo ar em outras latitudes, curar-se com o mesmo sal que é o mesmo em todos os oceanos e todos nós, afinal, ervas daninhas, bichos e gente, somos feitos do mesmo barro da olaria do Criador. O movimento de uma célula que se move para se unir a outra ou destruí-la, no microespaço do seu universo imperceptível, em nada difere da nossa viagem da Baía de Todos os Santos à foz do Capibaribe, da migração de um ganso selvagem do norte do Canadá até à Flórida e da viagem de um pedregulho do tamanho do nosso planeta mergulhando no fogo de uma estrela moribunda.
Tout ça ne vaut pas un clair de lune à Maubeuge!

 

6 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
12 58´29”S, 38 30' 93”W

António Vieira chegou a esta cidade ainda criança, cresceu e fez-se homem neste clima ameno e colorido, e regressou a Portugal aos 33 anos para assumir as maiores e mais delicadas responsabilidades que o rei tinha para confiar a um homem de confiança. Salvador era um centro de produção, de cultura e de saber à altura do melhor que havia em todo o reino, uma cidade cobiçada pelos predadores mais ambiciosos e poderosos do tempo; o reino estava em frangalhos, mas era ainda uma nação que lutava pela sobrevivência e pela manutenção de um espaço comercial. O jesuíta contribuiu como ninguém para a independência do reino e para a unidade da colónia brasileira. É um erro e um insulto à memória de um dos maiores portugueses e brasileiros de sempre, apresentar o padre António Vieira como um pregador. Os seus sermões são apenas a faceta lúdica da sua vida de cidadão do mundo, de diplomata, de missionário, de bandeirante, de defensor de causas nobres, de visionário de um futuro no qual ele terá sido por vezes o único a acreditar, mas que era o futuro certo de um país errado.

Quando embarcou a 27 de Fevereiro de 1641, numa época do ano pouco propícia para uma travessia, levava na sua bagagem todos os ingredientes necessários para montar um espectáculo de onze anos de ousada criatividade, um furacão que abalou a mediocridade de um reino acomodado ao espectáculo da pobreza e da intolerância. Já missionário no Maranhão, ainda se deu ao luxo de um eco ribombante do seu génio, à maneira de quem lembra que o espectáculo não acabou e que a cena continua ocupada. Fê-lo quase em delírio, num supremo gozo de palavra e de desafio, em três dos mais espectaculares sermões de toda a sua vida: o de Santo António aos Peixes, o da Sexagésima e o do Bom Ladrão. Tinha 47 anos, estava no momento mais vigoroso da sua vida, era o amigo do Rei e a palavra era a sua embriaguez.

Embarcou no exacto lugar onde ancorámos esta manhã para as cenas que vamos filmar hoje. A encosta era a mesma que está diante de nós, a Misericórdia e os edifícios do Colégio já eram aqueles que ainda lá estão. Entre os dois tinha a catedral hoje demolida e, do outro lado, a igreja de Nossa Senhora da Ajuda erguia-se então perpendicular à baía. Terá rezado as últimas orações antes do embarque na igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, não a basílica de hoje, trazida de Portugal pedra a pedra no século XVIII, mas a pequenina que ficava por detrás dela, e cujas paredes ainda lá estão. Nas proximidades do actual elevador os padres jesuítas e a família de Gregório de Matos possuíam guindastes para içar as pessoas da cidade baixa para a cidade alta. O Forte de São Marcelo chamava-se Forte do Mar e tinha sido reforçado depois das invasões holandesas. Navegando em direcção à barra ele viu ainda o convento dos beneditinos em reconstrução, o forte de São Pedro, a igreja de Santo António, o Forte da Barra e do outro lado a ilha de Itaparica. Ninguém sabe nada do que se passou a bordo durante aquela viagem até à chegada atribulada a Peniche nos últimos dias de Abril. Foi lá que começou verdadeiramente a sua história do futuro, o grande sonho de toda a sua vida, que ele nunca chegaria a contar em palavras.
Sonho de profeta é como choro de criança: não tem palavra, apenas grito levado pelo vento, que espanta e seduz. Uma fragrância efémera, a chama melancólica de uma candeia.

8 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
12 58´29”S, 38 30' 93”W

Foi dia de festa ontem ao fim da tarde no Rio de Janeiro. Meio milhão de pessoas festejaram na praia de Copacabana a eleição do monumento ao Cristo Redentor do Corcovado como uma das sete novas maravilhas do mundo. Os amigos de Salvador que nos acompanhavam também ficaram contentes, mas não tanto assim, já que consideram que a cidade de Salvador representaria melhor do que o monumento carioca o esforço cultural e tecnológico de um povo, através das suas obras de arte espalhadas por uma cidade inteira ao longo de 450 anos. Um dos nossos anfitriões era mineiro e logo disparou numa argumentação sustentada para defender que Ouro Preto merecia, mais do que qualquer outra cidade brasileira, fazer parte da lista. E mais gente houvera, mais sugestões de maravilhas cairiam do céu, mais poderosos argumentos saltariam do chão. O monumento do Corcovado tem apenas 75 anos e é a mais recente das novas “maravilhas”; a mais antiga, a cidade de Petra na Jordânia, tem 2.000 anos.Rio de Janeiro, apesar de um clima hostil de violência e insegurança, acolhe 35% de todos os turistas que visitam o Brasil. Não há muitas opiniões dissidentes quando se afirma em qualquer palco ou ecrã que é a cidade mais bonita do mundo, com tudo o que ela exibe: as suas montanhas, a baía, a lagoa e o oceano, os bairros luxuosos com ruas enfeitadas de vegetação luxuriante, a ousadia arquitectónica dos centros comerciais, a mancha verde que a sufoca de oxigénio, a dolce vita das praias, os malandros e as garotas desavergonhadas, as suas incontáveis favelas, os seus pecados, a sua perversidade. Cidade maravilhosa, ela encanta e seduz o forasteiro. Lá vivi quatro anos da minha vida há quarenta anos atrás e ainda hoje a saudade me invade cada vez que recordo as tantas coisas que lá ficaram por acabar, toda a beleza que eu não vi, toda a emoção que ficou por partilhar; hoje, a cada passagem pelo Rio, tento ainda agarrar alguns pedaços do que ficou disperso, aprender o que não foi entendido, sentir o poder vital da humanidade numa cidade que é um caldeirão de criaturas em delírio.

Das novas maravilhas do mundo, apenas uma se situa na Europa. Três são do continente asiático e outras três são do continente americano. A muralha da China é um complexo militar defensivo, o Taj Mahal é um monumento ao amor, a pirâmide de Chichen Itzá é um grande desafio à inteligência humana, a cidade de Machu Pichu é um exemplo do engenho da humanidade na luta pela sobrevivência, o coliseu de Roma uma evocação do espectáculo lúdico e do divertimento, a cidade de Petra o grande testemunho da matriz helénica da civilização ocidental. E o Cristo do Corcovado? Não é propriamente um monumento religioso, também não parece que seja uma indiscutível obra de arte, porventura uma proeza de engenharia, um ponto de observação privilegiado, um local de deslumbramento. Os seus braços abertos parecem acalantar os bairros do Flamengo e do Botafogo, a parte mais nobre e tradicional da cidade, e está de costas voltadas para a pobreza. O seu olhar fixa-se à distância, sem se aperceber da miséria que trepa pela montanha, mesmo por debaixo dos seus sovacos. As luzes que o iluminam e o fazem brilhar durante a noite ofuscam-lhe a vista para que não se aperceba dos pecados da cidade. Os urubus montam a guarda nos dias de verão, voando em círculos em redor do morro, empurrados para as alturas pelo ar quente, que os embriaga com o cheiro a suor humano e a podridão.

O maior espectáculo que se pode contemplar do alto do Corcovado é ao anoitecer, quando se acendem, como num fogo de artifício, as luzes da metrópole. Nos trópicos a noite cai de repente, sem crepúsculo; a cidade perde as suas cores e fica pálida, quase moribunda, até que um furacão de pirilampos a varre com uma luz artificial e efémera, qual cena de um teatro à escala de uma plateia de 12 milhões de espectadores. Mas o espectáculo não está mais disponível para ninguém, porque antes do pôr do sol os responsáveis pela segurança do monumento evacuam o local, por causa do perigo dos assaltos nos acessos rodoviários à terceira maravilha do mundo. E os 38 metros de betão no topo do morro ficam solitários, brilhando suspensos na escuridão do céu, por cima da negridão da mancha florestal da Tijuca.

Dentro de uma semana iniciam-se no Rio de Janeiro os Jogos Panamericanos, mais um espectáculo de luxo para a cidade maravilhosa. Nada é demasiado para homenagear a beleza, caos de fortunas e causa dos maiores desatinos da humanidade, desde a guerra de Tróia até ao poeta índio que ofereceu os seus olhos a uma mulher cega, para ela enxergar a beleza do seu próprio corpo. Saravá!

 

10 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
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Hoje é Terça-feira, dia de Oxumaré, orixá dos movimentos, mensageiro da chuva, São Bartolomeu, que veste as cores do arco-iris. É também dia de Ogum, senhor da guerra e dos caminhos, Santo António armado de espada e vestido de azul escuro. Salvador é a cidade dos orixás, que vieram de África na memória perturbada dos escravos e se reincarnaram deste lado do oceano com um vigor e uma vitalidade que jamais os africanos sequer sonharam. Convivendo com personagens do enredo cristão ganharam nova vida e novos adeptos de todas as etnias, europeus e indígenas que os veneram, recheando os terreiros de presentes. O Candomblé começou a constituir-se como culto religioso animista em Salvador no início do século XIX, baseado em práticas religiosas trazidas por escravos provenientes da Nigéria e do Benim. Seriam carregamentos onde viajavam chefes religiosos destinados à América do Norte, mas os navios foram capturados no mar e acabaram por chegar ao mercado do Brasil ao mesmo tempo que a família real portuguesa. Foi em Salvador que o ritual tomou forma, tendo-se espalhado por algumas cidades do interior bahiano e até Pernambuco, mais tarde alcançando o Rio de Janeiro, já nos finais do século, sob a forma de uma variante denominada Umbanda.

Da ortodoxia tradicional africana pouco resta para além de algumas semelhanças nos nomes das divindades e de um pequeno léxico de palavras rituais cujo significado original foi completamente esquecido. Todo o complicado cerimonial é de criação brasileira e faz parte da identidade de uma faixa considerável da população bahiana e carioca; nem o Candomblé nem a Umbanda são rituais religiosos exclusivos da etnia negra, antes pelo contrário, congregam todas as etnias e são partilhados tanto por adeptos de ascendência africana como europeia e indígena. Na represa do dique do Tororó, o derradeiro vestígio do lago que rodeava a cidade antiga, os orixás de Tatti Moreno dançam sobre as águas, simbolizando a sua vinda de África, vencendo um oceano inteiro. Nos terreiros rituais, jovens de todas as classes sociais passam por um rigoroso noviciado que dura de seis meses a um ano, iniciando-se na prática religiosa e aguardando a incarnação do orixá que passará a servir-se do corpo deles para se manifestar. Terminada a iniciação eles voltarão aos seus afazeres correntes: são gente de todas as classes sociais, servidores públicos, professores, advogados, médicos, que nas cerimónias do terreiro passarão a ser Exú à Segunda-feira, Yansã à Quarta-feira, Oxóssi à Quinta-feira… Domingo não é dia de Orixá, porque é dia de Jesus Cristo. Ele reina sobre todos os Orixás e é o senhor supremo da vida que jorra do poder matricial de Yemanjá, no dia de Sábado. Odoyá!



14 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
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No próximo ano de 2008 festejam-se duas datas importantes no calendário dos eventos culturais luso-brasileiros: os 200 anos da chegada da família real ao Brasil e os 400 anos do nascimento do padre António Vieira. Em ambos os eventos a cidade de Salvador tem um papel importante: aqui viveu o jesuíta durante 42 anos e por aqui passaram alguns navios da frota real, fazendo uma escala de 35 dias. O roteiro de Vieira passa por um espaço muito mais vasto e ainda temos mais oito meses de trabalho e de navegação para o completarmos; a viagem da família real foi mais curta e tem outro significado.

Uma parte da frota que saiu de Lisboa a 29 de Novembro de 1807 com cerca de 14.000 pessoas que escapavam às tropas francesas de Junot entrou na Baía de Todos os Santos. Nos navios vinham a rainha D. Maria e o príncipe regente D. João VI que desembarcou a 22 de Janeiro de 1808, e aqui permaneceu até 26 de Fevereiro. Devido ao seu estado, afectada pela loucura, a rainha permaneceu sempre a bordo. Outros navios, desgarrados da frota, já tinham chegado ao Rio de Janeiro a 17 de Janeiro com uma parte da família real e milhares de pessoas. Um testemunho visual do acontecimento foi o oficial holandês Quirijn Ver Huell, que se encontrava em Salvador e descreveu assim a barafunda que a chegada inesperada de tão importante comitiva provocou nos moradores: “É fácil imaginar a animação e a agitação que a presença da família real inteira produziu em Salvador. Contudo, muitos dos mais importantes moradores logo perceberam que tamanha honra era mais penosa do que propriamente agradável. O nosso amigo professor Ferreira, por exemplo, dentre tantos outros, recém-chegado à cidade proveniente da sua casa de campo em Montserrat, foi logo obrigado a migrar para lá outra vez. Acontece que, para alojar na cidade o séquito do príncipe regente, o governador resolveu simplesmente seleccionar de forma arbitrária algumas das suas melhores casas (ou seja aquelas pertencentes aos seus melhores habitantes). A espaçosa casa do professor Ferreira, portanto, junto com inúmeras outras, foi marcada por um funcionário do governo com as letras E.R. (El Rei). Mas não era só isto. O bom homem devia deslocar-se para a sua casa de campo, deixando para trás a sua residência, móveis e tudo o mais à inteira disposição do grande senhor que lhe daria a honra de fazer uso daquilo tudo.”

O incómodo durou pouco mais de um mês e os navios zarparam para o Rio de Janeiro, onde chegaram a 7 de Março. Entretanto, o regente assinou alguns decretos de primeira importância para a colónia subitamente promovida a reino: a abertura dos portos do Brasil aos navios das nações amigas, legalizando assim uma situação há muito consumada, a criação de uma escola de cirurgia em Salvador que foi o núcleo de uma faculdade de medicina e a criação de indústrias de moagem e de vidro. Apesar de não sofrer de loucura como a mãe, o regente estava de facto alheio a quase tudo o que se passava à sua volta e assinava onde os seus ministros lhe indicavam, por cima das suas iniciais traçadas a lápis no sítio certo. Aos 40 anos ele não era capaz de escrever sozinho o seu nome e a princesa sua esposa tratava-o ao modo e ao jeito das suas incapacidades.

A chegada ao Brasil de tão numerosa caravana modificou por completo a situação da colónia, abrindo o caminho para uma nova era na história económica e política de um povo que optaria pela sua independência catorze anos mais tarde. Quando a família real regressou a Portugal, em 1821, dos 14.000 que tinham deixado o reino apenas 4.000 acompanharam. As mudanças sociais, políticas e económicas que ocorreram durante este tempo foram feitas à medida das ambições desta elite de gente que nunca mais pensou em regressar, mas acabaram por beneficiar o Brasil inteiro.

Festejar tão importante acontecimento é uma oportunidade para redescobrir o nosso passado, recuperando nos factos históricos a matéria prima da nossa identidade. Certamente que o acontecimento deveria ser comemorado com todo o aparato que a efeméride merece. Já existe um comissário nomeado em Portugal para coordenar os eventos, Rui Rasquilho (comissao200anos@hotmail.com), mas os bahianos com quem convivemos sentem-se ofendidos pelo pouco interesse dos portugueses em comemorar dignamente os 200 anos da chegada da família real. Já é assunto de piadas a vinda de um grupo de mais de uma centena de cidadãos representando as marchas do Santo António da cidade de Lisboa, que vão desfilar nas ruas de Salvador por umas horas, ao custo de cerca de um milhão de reais, enquanto a grande maioria dos habitantes da cidade não tem a mínima ideia de quem foi esse tal João Sexto que tem nome de rua no bairro de Brotas. Porventura até será melhor que não saibam, porque se as crianças descobrirem que não é preciso saber escrever para ser rei, ficarão ainda menos motivadas para frequentar a escola.

A família real em questão não é nenhum modelo digno de admiração. O que está em causa, no entanto, não é a personalidade de um indivíduo nem o perfil de uma família, mas sim um acontecimento que abriu o Brasil para a modernidade e projectou todo o espaço da língua e da cultura portuguesa para o futuro. Foi o maior acontecimento político de toda a história do Brasil e merece ser festejado com toda a dignidade. O facto de assumirmos a nossa fraqueza no contexto da comunidade europeia não implica que em tudo o que se faz não se ultrapasse a mediocridade e se paralise a imaginação e a criatividade em benefício de um folclore banal a custos desenfreados, sem objectivos definidos. O disparate e o desperdício são sintomas da ignorância e da pobreza, de uma alienação colectiva. Não é essa a imagem real de um país com passado e que ainda acredita no futuro. E afinal, desta vez, precisamos de fugir de alguém?

 

16 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
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Hoje tenho saudade de Shipagan. Foi como um súbito regresso a um passado de quase 30 anos, quando Johanne pescou na maré baixa os primeiros mexilhões da sua vida, depois ensinei-lhe a limpá-los e a cozinhá-los e fizemos uma festa a bordo. Era dia de São Pedro, dia do seu aniversário e convidámos alguns pescadores. Durante a festa um deles pegou num par de colheres e deu-nos um concerto de cantoria e ritmo, só com duas vulgares colheres de comer caldo que emitiam sons diferentes conforme a posição da palma da mão e o toque no joelho. Foi um serão de encantamento naquele pequeno porto do fim do mundo, a descoberta de coisa tão simples e tão linda que nunca mais esqueci e que de repente, hoje pela manhã, me fez correr lágrimas de saudade. Ai que saudade eu tenho de Shipagan !

Tive o privilégio de assistir ao ensaio de uma ópera que está a ser montada em honra do grande médico brasileiro Oswaldo Cruz, com a Orquestra Sinfónica da Bahia. Intitula-se O Cientista e deve ser exibida brevemente. No segundo acto da ópera há um momento em que se exibe em palco um grupo de capoeira, o mesmo que eu já tinha visto actuar no ano 2000 num hotel de Salvador, quando da regata comemorativa da chegada de Cabral e que tinha deslumbrado todos os forasteiros pelo desempenho artístico e pela postura atlética dos seus componentes. Eu escrevi no Diário de Bordo de 18 de Abril daquele ano: “o grupo de dança de capoeira que animou a noite conseguiu com a sua juventude e a sua vivacidade, com a beleza escultural daqueles corpos de ébano esculpidos pelos deuses, levar tudo e todos para fora do mundo real”.Mas desta vez havia algo mais para além do requintado ambiente do moderníssimo teatro Castro Alves e do espectáculo visual que nos faz reter o fôlego. Fazia parte da orquestra um berimbau e durante dez minutos não foi somente a vista que se regalou com a coreografia, foi uma composição para berimbau e orquestra digna dos mais emblemáticos palcos do mundo. Nunca pensei que se pudesse arrancar tanta emoção de um coco amarrado a uma haste de pau com uma corda de ferro ferrugento esticada, tangida com um graveto e sustentada com um calhau. Também nunca pensei que jamais na minha vida eu assistiria a uma peça musical para berimbau e orquestra, apesar de pertencer àquele grupo de gente que considera que o impossível é apenas aquilo que ainda não aconteceu.

As coisas são assim mesmo, só não acontecem até ao momento em que alguém as concebe e quebra os preconceitos. Aconteceu com o Concerto de Aranjuez, onde entrou um violão, aconteceu com Catulo da Paixão Cearense que levou o instrumento para o espaço selecto de uma academia, e porque não havia de acontecer aqui mesmo, em Salvador, terra por excelência do berimbau? Se duas colheres podem emocionar, se o ritmo batido numa pele da cabra esticada no tampo de um cortiço marca o passo do avanço de um exército inteiro, se um pedaço de bambu enfeitado de buracos presta homenagem aos deuses, porque é que um berimbau não faria exultar a plateia da Ópera de Paris?

A função da arte é emocionar, desvendar o imaginário adormecido em cada ser humano, para despertar os sentimentos mais profundos, que antecedem todas as verdades. Da arte mais erudita e sofisticada à mais simples e ingénua, o que alimenta o prazer e liberta as lágrimas é sempre aquele arrepio exacto no momento oportuno, arrancado do nosso inconsciente por uma orquestra inteira, um par de colheres, um saxofone ou um berimbau.

Shipagan, ce n’est ni fleuve ni rivière
Ce n’est pas encore la mer
C’est tout simplement L’Acadie!

Ai que saudade eu tenho de Shipagan!

 

17 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
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Estamos de largada, mas uma largada à maneira das antigas, quando as embarcações esperavam em Paço de Arcos o momento propício para se fazerem ao oceano. Era lá que as caravelas içavam as suas hastes, as naus embarcavam os últimos mantimentos frescos, onde se caprichava nos últimos preparativos e se aguardavam os passageiros importantes, dias e por vezes semanas, quando o tempo ou os afazeres de última hora de algum viajante especial estragavam os planos do capitão. Foi lá que o padre Vieira embarcou naquele dia 22 de Novembro de 1651 com destino ao Maranhão, fazendo a caravela de Alfama perder a maré da manhã e ter que largar sozinha no final do dia, desgarrada da frota; foi lá que embarcaram muitos milhares daqueles que acompanharam a família real na debandada para o Brasil, quase dia por dia, 156 anos depois. Nós também vamos esperar na Baía de Todos os Santos mais uns dias, mas por razões de visitas importantes.

Ontem foi dia de homenagear um dos grandes vultos da educação no Brasil, certamente o maior do século XX, Anísio Teixeira. Se estivesse vivo teria 107 anos, mas faleceu tragicamente em 1971, vítima de uma queda até hoje por explicar, no poço do elevador de um prédio do Rio de Janeiro. Não pude declinar o convite de falar no encerramento dos trabalhos do simpósio que se realizou na Fundação que tem o seu nome e que se dedica à formação contínua de professores, tanto mais que fui uma das pessoas que conviveu com ele nos últimos anos da sua vida. Foi um filósofo da educação, o grande defensor e promotor da escola pública para todos no Brasil desde o início dos anos 30, um dos pioneiros da chamada “escola nova”, o fundador da mundialmente conhecida “escola do Parque” em Salvador, o criador da primeira faculdade brasileira para a formação de professores, fundador da Universidade de Brasília (onde trabalhou também Agostinho da Silva) e autor de numerosos textos entre os quais o mais citado e traduzido “Educação não é Privilégio”.

O seu trabalho pioneiro em educação foi interrompido por duas vezes, por duas ditaduras: a de Getúlio Vargas em 1937 e a dos militares em 1964. Nesta última ocasião ele viajou para os Estados Unidos, onde na sua juventude tinha sido aluno do grande pedagogo John Dewey, mantendo sempre com a Universidade de Columbia estreitas relações intelectuais. Convivi com Anísio Teixeira a partir dos finais de 1965, depois do seu regresso ao Brasil, quando trabalhava na Fundação Getúlio Vargas e esperava por melhores dias para continuar a defender e implementar as suas ideias inovadoras em educação. Nesses anos intensos de criatividade e esperança nomes como Darcy Ribeiro, Werneck Sodré, Emanuel Carneiro Leão, o padre Fernando Bastos de Ávila e Rose Marie Muraro enfeitavam os serões mais animados do apartamento do paraplégico mais culto do Brasil, possuidor de uma das mais actualizadas bibliotecas de todo o continente, simplesmente conhecido por “senhor Saraiva”. Também por lá apareceu um dia um jovem cantor e compositor de sucesso, que sonhava fazer do poema Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto, um grande espectáculo musical. E conseguiu. Chamava-se Chico Buarque de Holanda; éramos e ainda somos da mesma idade, os mais jovens daquele grupo de gente empenhada em mudar o rumo das coisas. Em 1968 foram todos dispersos, cada qual tinha as suas razões, que afinal eram as mesmas: continuar vivo. Só Anísio Teixeira, o mais velho e respeitado daquele grupo, não conseguiu.

Nos últimos dias o nosso trabalho também tem sido apreciado de perto pela Fundação do Instituto Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), através da sua filial de Salvador. Trocámos convites de visita, e encontrámo-nos por várias vezes tanto nas instalações da Fiocruz em Salvador como a bordo do CHIC, o que resultou na deslocação a Salvador, para um encontro connosco, do Presidente da Fiocruz, cuja sede é no Rio de Janeiro. O encontro será a bordo, na próxima Segunda-feira. A instituição dedica-se à investigação bio-médica (o seu fundador, que lhe deu o nome (1872-1927), foi o médico que erradicou a febre amarela da baía de Guanabara) e à educação ecológica, ambiental e para a saúde, com programas educativos por todo o Brasil. Uma das actividades da Fiocruz consiste em promover o conhecimento humano através do convívio e do encontro de pessoas e comunidades; no ano 2000, quando da viagem comemorativa dos 500 anos do encontro de Cabral, viajou a bordo do Barconauta, entre Salvador e o Rio de Janeiro, uma das pessoas que montou uma exposição itinerante da Fundação intitulada A Ciência dos Viajantes. Ontem, quando me anunciaram a visita do Presidente, presentearam-me com uma edição de luxo de Os Diários de Langsdorff, em três volumes, editados pela Fiocruz. Georg Heinrich von Langsdorff foi um cientista russo que empreendeu uma viagem científica pelo Brasil nos anos de 1824 e 1825.

É por causa dessa visita importante que o CHIC permanece mais uns dias em terras de Anísio Teixeira, de Castro Alves, de Maria Bethânia… e de Vieira. É este o nosso trabalho, o nosso jeito de construir uma cidadania.

 

18 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
12 58´29”S, 38 30' 93”W

É uma viagem inesperada, necessária para o progresso do nosso trabalho, mais de duas horas de avião até ao Rio de Janeiro, sem tempo para apreciar o frenesim da Avenida Rio Branco, a doçura invernal do calçadão de Copacabana, a boémia encantadora da Lapa e muito menos de sentir o ambiente desportivo dos Jogos Panamericanos. Na realidade, nem sequer terei tempo de pisar terrenos da cidade do Rio e vou esquecer a ideia de passar a ponte e apreciar, do outro lado da baía de Guanabara, a beleza da cidade maravilhosa ao nascer do sol. O avião que me transporta não vai pousar no aeroporto Santos Dumont, ali mesmo no centro da cidade, a dois passos do Passeio, mas no Tom Jobim, na Ilha do Governador. Telefonar aos amigos de longa data é a única esperança de passar alguns momentos de convívio relaxante, já que as horas estão contadas e a agenda é feita por gente que sabe donde vem e para onde vai e que pensa à maneira dos países da eficiência. Há muita coisa muito séria a fazer no “continente” brasileiro com o material que estamos a produzir sobre Língua, Identidade e Cidadania, resultante do nosso Cruzeiro Histórico pelos espaços do padre António Vieira. Saboroso e refrescante, o fruto merecido da nossa persistência.

Entretanto o CHIC vai zarpar para Recife, onde chegará na próxima semana. Vou ter que voltar a Salvador a 10 de Outubro, para a apresentação oficial dos programas comemorativos dos 400 anos do nascimento de Vieira e estarei de novo no Rio de Janeiro dois dias depois para uma conferência plenária num Congresso sobre Educação e mais algumas intervenções, antes de zarpar de Belém do Pará para a travessia do Atlântico pelos Açores, com chegada prevista a Portugal em finais de Novembro. Assim ficam corrigidas as datas do nosso périplo, inicialmente pensado para ser mais curto em tempo. Se ainda alguém pensa que estamos a passar férias a bordo de um luxuoso veleiro numa ilha encantadora, ouse visitar-nos, partilhar alguns dias da nossa vida e saborear os pratos da nossa produção. Tem dois beliches disponíveis a bordo e a loiça lava-se duas vezes por dia com água quente.

Vieira nunca viajou por espaços a sul da Bahia, mas o seu perfil moral, a dimensão dos seus ideais, a rectidão da sua visão estratégica como diplomata, missionário e patriota, fazem dele o cidadão número um da nossa história e das nossas culturas comuns. Percorrendo a rota da sua vida descobrimos através dele a nossa própria identidade e o nosso espaço de intervenção no mundo globalizado em que vivemos e que ele, ao seu jeito e no seu tempo, teve o génio e a coragem de descrever.
“Entre os semeadores do Evangelho há uns que saem a semear, há outros que semeiam sem sair” (Sermão da Sexagésima).


20 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
12 58´29”S, 38 30' 93”W

O massacre dos “meninos Rio” foi há catorze anos atrás e emocionou o mundo: um grupo de policias fez uma razia nocturna pelas ruas do centro do Rio de Janeiro, abatendo e ferindo a tiro, indiscriminadamente, uma quantidade de jovens que viviam na rua e da rua, iniciando-se nas manobras da marginalidade e da criminalidade. A quantidade de população cuja casa é a rua triplicou no Rio de Janeiro nos últimos 10 anos e hoje ela é composta de três gerações de seres humanos que não têm qualquer referência domiciliar que não seja o asfalto e os passeios da grande cidade. Avós, pais e netos partilham um espaço de sobrevivência primitiva e de liberdade total em relação a todas as regras éticas e políticas de uma cidadania. No ano 2000 houve um assalto a um autocarro de transporte urbano que se dirigia do centro da cidade para uma zona nobre da periferia, o bairro da Gávea. O assaltante chamava-se Alex o Mancha e tinha sido um dos sobreviventes daquele massacre. A polícia interveio e prendeu o Mancha, não sem antes abater a tiro uma jovem professora refém; no caminho para a esquadra o assaltante acabou estrangulado pelos polícias.

Contaram-me que no mês passado, no dia em que passavam 7 anos sobre esta tragédia, o trânsito foi interrompido por algumas horas na rua São Clemente. Dois grupos de pessoas depositavam coroas de flores no local do assalto: uma em lembrança da jovem professora da favela da Rocinha, outra por Alex o Mancha, menino da rua. Ontem comemoravam-se outros tantos anos sobre a morte do jornalista Lima Sobrinho e de Dona Neuma, a mãe coragem da Mangueira. Não houve coroas de flores. Como por milagre, quando começaram os Jogos Panamericanos, a população de rua da zona nobre da cidade diminuiu drasticamente. Como os pássaros migratórios, devem ter procurado outro calor, outros sabores, outro aconchego.Salvador da Bahia não tem tantos meninos de rua, mas calculam os entendidos que haverá por toda a cidade, de 3 milhões e meio de almas, à volta de 12.000 pessoas sem domicílio, das quais 85% são jovens de menos de 14 anos. Eles vagueiam sem destino pelas ruas comerciais, na proximidade dos espaços turísticos, procurando refúgio nas zonas degradadas onde não são escorraçados nem procurados pelos serviços de protecção de menores. Alguns têm apenas 6 anos de idade e a tarefa diária consiste em pedir moedas aos passantes. Pelas 6,30 da manhã, o lote que dorme às portas da padaria Cayrú acorda quando se abrem as portas, alvejando os primeiros clientes; não querem que lhes compre um pão e um copo de leite, querem as moedas dos trocos. Eu mesmo insisti um dia em oferecer um pão e um sumo de fruta; a criança largou pela porta fora e foi vender a esmola aos passantes por meio real. Como os pardais, não se afeiçoam a gaiolas nem a outro alimento que não seja o que eles mesmo catam.

Se lhe perguntamos porque não estão na escola respondem que não sabem onde tem escola, que a comida que dão não é boa, que não têm sapatos nem roupa. As duas camisolas que lhes demos, vimo-las na mesma tarde no corpo de outros e se encontram no lixo um par de sapatos à medida do pé, será para transformar a colheita em centavos com que se abastecem em cola de sapateiro, álcool de automóvel, maconha ou crack. Apenas a viatura do serviço de protecção de menores começa a descer a ladeira eles desaparecem como por magia e reaparecem depois do pôr do sol, porque o serviço dos funcionários públicos tem hora marcada para terminar. Sem saber ler nem escrever, conhecem as horas do dia e o valor das moedas; a rua é um imenso espaço de aventura e de liberdade, de coragem e desespero.
Noite avançada, quando a cidade se apaga, eles deitam-se na calçada, aconchegados em desperdícios de cartão ou simplesmente enrolados nas suas vestes desmedidas, adormecem à meia dúzia, quando não é uma família de pai, mãe e crianças, numa atitude de ternura que encanta, emociona, perturba.

“Il semble que la misère soit moins terrible au soleil”! Mas não é, não. É uma maneira mais vistosa e patética de saborear a vida e de a jogar fora com dignidade, lentamente, como morrem as árvores.

 

21 de Julho de 2007, Salvador da Bahia.
12 58´29”S, 38 30' 93”W

O nosso último dia útil em Salvador foi reservado para os encontros protocolares oficiais onde se definiram as futuras actividades relacionadas com as comemorações dos 400 anos do nascimento do padre António Vieira no Estado da Bahia. O encontro teve lugar no Palácio Rio Branco, sede da Fundação Pedro Calmon cujo presidente, o professor Ubiratan Castro, é o responsável por todos os eventos relativos a Vieira durante o ano de 2008. Estava presente o Cônsul de Portugal, João Sabido Costa, os Secretariados de Estado da Cultura e da Educação, a directoria da TVE, do Arquivo Histórico, e mais algumas instituições de carácter cultural do Estado da Bahia. Participou também o responsável pelas actividades culturais da Câmara de Comércio Portuguesa da Bahia, Eduardo Zanatta. Tínhamos anteriormente sido convidados a visitar a Gráfica do Estado da Bahia onde o seu director, Hélio Márcio Carneiro, nos fez conhecer os potenciais de uma das gráficas mais modernas de todo o continente sul-americano e nos sugeriu a criação de um novo produto para 2008: uma publicação em banda desenhada sobre Vieira, de modo a atingir uma camada diferente e muito importante dos leitores brasileiros. Um desafio novo que aceitámos, comprometendo-me pessoalmente a fornecer o guião da história assim como todos os dados de carácter histórico para que uma equipa de desenhadores se encarregue da missão.

No próximo dia 10 de Outubro, neste mesmo local, terá lugar o lançamento oficial do programa das comemorações. Estaremos nas vésperas da nossa partida para a travessia do Atlântico e viremos do Pará até à Bahia para este evento, onde eu apresentarei numa palestra a minha visão de Vieira e o Luís, através de um documento vídeo, projectará um pedaço daquilo que serão os momentos visuais do nosso trabalho. Três artistas de Salvador vão participar nas obras a editar sobre Vieira. Ângelo Roberto tem mais de 50 anos de carreira como artista plástico em pintura e desenho, e terá a responsabilidade da reprodução de cartas e das ilustrações gráficas. Joel de Almeida é director de fotografia e Lúcio Marques realizador; eles irão completar o trabalho de vídeo que não pudemos concluir em Salvador sobre este espaço onde Vieira passou 42 anos da sua vida.

No final da manhã chegou a notícia da morte de António Carlos Magalhães, um dos maiores homens políticos de sempre do Estado da Bahia, polémico e contundente quanto baste para merecer dos seus adversários o maior respeito e as mais vigorosas investidas; ele foi durante quatro décadas a figura de proa deste Estado que muito lhe deve e que lhe presta a partir de hoje relevantes homenagens, com 5 dias de luto. As actividades que deveríamos realizar ontem da parte da tarde foram canceladas e serão tratadas a bordo neste fim de semanaAssim termina a nossa estadia em Salvador da Bahia, após 80 dias de muito trabalho, algum sofrimento e uma overdose de determinação. Vem aí uma frente fria, é ela que vai levar o CHIC até Recife, onde nos esperam há mais de um mês. A escala será muito curta, apenas 3 dias.


24 de Julho de 2007, Mar da Bahia.

Este Diário de Bordo, como toda literatura de viagem, é um exercício de escrita, uma partilha de emoções. Para que a comunicação alcance todos aqueles que viajam através deste texto e com ele, há que manter-nos à superfície, sem nos dispersarmos em superficialidades; mas às vezes, mesmo sem descer às profundezas, à simples luz do dia, a realidade choca e arrasta-nos numa cachoeira de emoções que abalam as nossas certezas e confundem os nossos parâmetros do bem e do mal. Porque nem o mundo nem a vida foram programados por nós nem pelos nossos mestres, confrontamo-nos com realidades que não se encaixam na arquitectura rígida das nossas gavetas mentais.

Descartar a realidade como se ela estivesse simplesmente errada é o modo mais directo de enveredar pela loucura, mas o mais fácil de encontrar a segurança. Entre a violência de uma realidade chocante e a segurança dos conceitos sistematizados, o refúgio mais seguro é o dos conceitos partilhados pelas massas acomodadas, a mansão da felicidade louca.

Este Diário destina-se a partilhar uma viagem fora de casa, longe do conforto da mansão de todas as felicidades, ao encontro de um mundo diferente e de valores camuflados, viagem guiada por um génio que no seu tempo percorreu as avenidas da riqueza e as picadas do desespero, ao encontro dos poderosos e dos humildes de um reino que só ele vislumbrava, na história do futuro.

Este pedaço de mar que nos separa do espaço mais emblemático da vida de Vieira, o antigo Maranhão onde ele viveu as suas maiores paixões, é também o momento de uma viragem, uma nova porta que se abre para um mundo diferente que será daqui por diante proposto aos leitores deste Diário. Só que esta parte da viagem que agora se inicia exige cinto de segurança e muita ginástica, porque a rota é sinuosa e nem sempre à tona.

 

28 de Julho de 2007, Recife.

Vista do mar, quando logo após o pôr do sol toda a cidade se incendeia com milhões de pirilampos, a grande metrópole pernambucana dá uma imagem de opulência e de riqueza como nenhuma outra grande cidade brasileira. Cabocla civilizada, Veneza do Nordeste, noiva do Capibaribe, nenhuma apelação consegue traduzir a grande complexidade desta capital que nasceu nas lamas do estuário de um rio, seguindo o modelo de uma cidade holandesa e cresceu sem tino, aglutinando foragidos das secas do sertão e empreendedores ousados que ao longo de quase quatro séculos a afeiçoaram ao seu modo de vida rebelde e inovador. Nem o rio seria famoso sem a sua cidade, nem a cidade teria existido sem aquele rio. Mas Recife é uma cidade marítima, protegida do oceano por uma barreira natural de recifes, donde herdou o nome.

Mais uma vez fizemos uma navegação rápida graças à ajuda de uma frente fria que nos acompanhou desde Salvador e nos colocou aqui em três dias e meio, com bátegas de chuva e mudanças frequentes de força e direcção de vento. Começaram a chegar os grandes cetáceos a esta costa na sua migração anual e aconteceu durante a noite de Sexta-feira, navegando com vento forte ao largo da foz do rio São Francisco, chocarmos com uma baleia, provavelmente adormecida à tona de água, que sacudiu violentamente o veleiro, sem causar outros estragos para além de arrancar o friso de protecção de bombordo. Pareceu-nos ser uma orca, pelas manchas nítidas de preto e branco do seu corpo, pelo tamanho relativamente pequeno e pela agilidade com se sacudiu após o choque.

À chegada ao porto, pelas 20 horas, deparámos com um impressionante espectáculo de luzes, o mareato de gala do navio-escola Sagres fazendo escala em Recife na viagem anual de instrução de cadetes, zarpando amanhã para o Rio de Janeiro, para depois visitar Santos e Montevideu. Atracámos por esta noite uma centena de metros adiante do grande navio-escola, no centro restaurado da cidade antiga, mesmo em frente ao parque escultural em cerâmica da autoria de Francisco Brennand, que ornamenta o dique de protecção do porto. Para não variar, a chuva insiste em acompanhar-nos, tão cerrada que nos esconde a vista do monumento iluminado, do outro lado do rio que corre em enxurrada. Mas não chega toda a água doce do céu para diluir os dejectos que a corrente arrasta. Amanhã pela tarde, depois das despedidas à Sagres, iremos acostar no Cabanga Iate Clube, próximo da cidade nova.

O nosso objectivo é seguir quase três anos da vida do padre António Vieira, que ensinou no colégio dos jesuítas de Olinda, a cidade do outro lado do estuário, entre os 18 e os 20 anos, antes da chegada dos holandeses a Pernambuco. É também nossa intenção olhar de perto os vestígios e a vitalidade actual da comunidade judaica, que fez da antiga sinagoga instalada na cidade construída por Maurício de Nassau um memorial e um centro religioso muito activo, com o mesmo nome de antigamente, Kahal Zur Israel. Quando os judeus de origem portuguesa que vieram para cá com os holandeses se retiraram de Recife em 1654, foram ajudar a construir uma outra cidade muito a norte, também numa ilha da foz de um rio, onde nasceu um dos impérios do mundo. O acto da fundação daquela cidade, em terras compradas aos indígenas por um punhado de moedas, foi escrito em 19 línguas. Uma delas era o português dos judeus de Recife, aliás da Holanda, aliás de Portugal; a cidade foi criada com o nome de Nova Amsterdão e viria a chamar-se mais tarde Nova Yorque. Não era esse o Quinto Império da utopia de Vieira, mas era um novo império que nascia.

Um desses judeus de Recife, rabino da sinagoga Kahal Zur Israel, preferiu regressar a Amsterdão e iniciou a campanha para a construção de uma grande Sinagoga Portuguesa, hoje um dos monumentos emblemáticos da cidade das flores e dos canais, onde a “oração da casa real” ainda é rezada em língua portuguesa. Ele chamava-se Isaac Aboab da Fonseca e era natural de Castro Daire. O seu nome tem lugar de primeiro relevo no memorial da rua dos Judeus, na Recife antiga restaurada.

Nas margens dos rios de Babel, onde morávamos,
Sentávamo-nos a chorar com saudades de Sião.
E pendurávamos os alaúdes nos salgueiros,
Quando os nossos donos nos pediam que cantássemos canções da nossa terra.
Como poderíamos cantar o louvor de Adonai numa terra hostil?
Salmo 137

 

31 de Julho de 2007, Recife.
08 04´47”S, 34 53' 23”W

Salvador é incontestavelmente o berço genético da nação brasileira, mas Recife representa o poder de criatividade e de aventura, tanto no plano do desbravamento do espaço como no da produção intelectual. Esta foi tardia, mas poderosa quando chegou. Já a Bahia, o Rio de Janeiro, Minas Gerais, Maranhão e São Paulo tinham contribuído com poetas e intelectuais para a história cultural brasileira quando surgiu o primeiro movimento criativo pernambucano de relevo, à volta de uma Escola de Direito, corria o século XIX.

A primeira cidade pernambucana foi Olinda, destruída em 1638 por Nassau, quando a Companhia que ele representava decidiu criar uma nova capital no estuário dos rios. Por Olinda passou nos últimos anos do século XVI o autor de um poema épico em homenagem ao capitão governador de Pernambuco, Jorge de Albuquerque Coelho, a Prosopopeia, publicada em Lisboa no ano da sua morte, em 1601. O autor era um cristão novo chamado Bento Teixeira, natural do Porto, que esteve aqui refugiado no convento dos beneditinos depois de ter assassinado a mulher. Descreve assim o porto de Recife: “Um porto tão quieto e tão seguro / Que para as curvas naus serve de muro” (Prosopopeia, XVII). Outro refugiado célebre que faleceu nesta cidade de Recife em 1696, foi o bahiano Gregório de Mattos Guerra, o “Boca do Inferno”, pouco tempo depois do seu regresso do exílio de Angola. Ele não gostava da cidade: “O povo é pouco, e muito pouco urbano / que vive à mercê de uma linguiça, / unha de velha (presunto salgado) insípida enfermiça / e camarões de charco em todo o ano”.

A riqueza e a posição estratégica de Pernambuco despertaram a cobiça da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, que ocupou e governou uma fatia importante do litoral nordestino durante 24 anos, de 1630 a 1654, deixando por toda a parte marcas profundas da sua presença. Uma das mais difíceis missões do padre António Vieira, durante o período da sua actividade diplomática, foi negociar com os holandeses o destino de Pernambuco, numa fase crítica e delicada para a nova dinastia de Bragança e para a sobrevivência de Portugal como nação independente. Um beneditino pernambucano chamado Loreto Couto escrevia em 1757 um texto intitulado Desagravos do Brasil e Glórias de Pernambuco, onde fazia comparações pertinentes entre os habitantes do reino donde provinham os colonos e o modo de vida em Pernambuco.

Foi aqui que nasceu o primeiro movimento republicano do Brasil, em 1817; após o regresso de D. João VI ao reino os pernambucanos não aceitaram D. Pedro como soberano do Brasil e criaram em 1824 um movimento separatista com o nome de Confederação do Equador. No ano seguinte nascia o jornal Diário de Pernambuco, o quotidiano ininterrupto mais antigo de toda a América do Sul. Em 1827 é criada uma Escola de Direito, primeiro em Olinda e logo transferida para Recife, que foi o berço de uma actividade intelectual de primeiro relevo para a história moderna brasileira. Daqui saiu o primeiro grande movimento abolicionista, à volta das ideias germanistas de Tobias Barreto, Clóvis Bevilaqua e Sílvio Romero, e da poesia do movimento “condoreiro”, cujo líder intelectual foi o jovem bahiano Castro Alves.

Muito deve a Pernambuco o modernismo brasileiro, cujo líder moral e executivo foi Graça Aranha (1868-1931), maranhense formado na Escola de Direito de Recife; um dos modernistas mais emblemáticos foi o poeta Manuel Bandeira (1896-1968), nascido nesta cidade. São pernambucanos nomes de relevo como o sociólogo e antropólogo Gilberto Freyre, o historiador Câmara Cascudo, o pedagogo Paulo Freire, o poeta João Cabral de Melo Neto, autor de Morte e Vida Severina, o escritor Ariano Suassuna, actualmente Secretário de Cultura do Estado de Pernambuco, suportando alegremente os seus 80 anos, autor do Auto da Compadecida e do romance A Pedra do Reino, recentemente exibido em episódios televisivos.

Olinda foi a primeira arquidiocese do Brasil e Recife faz lembrar a figura de ousadia e santidade de D. Hélder Câmara, arcebispo de Olinda-Recife durante o tempo da ditadura militar. Juntamente com Josué de Castro, que se inspirou da realidade pernambucana para os seus textos Geografia da Fome e Geopolítica da Fome, eles foram a consciência do povo brasileiro num dos momentos mais difíceis da sua história. Tive o privilégio de conhecê-los e de colaborar de muito perto com ambos, nos tempos das Semanas Latino-Americanas de Paris (Esprit, Seuil, nr.7-8 de 1965) e da Conferência Episcopal Latino-Americana em Rio del Plata (1966), onde assisti a D. Hélder com documentação e textos (SPES, Rio de Janeiro, nr. 32). Há que acrescentar a figura do jornalista Alexandre Lima Sobrinho, considerado o “cidadão número um do Brasil”, modelo de isenção e de clareza de espírito, que faleceu em Julho de 2000. Mas Recife tem muito mais para revelar a um forasteiro atento.

 

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